Redação do Enem: texto da BBC Brasil serviu de base
A reportagem,
de Paula Idoeta e Mariana Della Barba, trouxe os dois lados da polêmica e
também a experiência de outros países, um tipo de enfoque que é a marca da BBC
Brasil.
Com um
jornalismo que busca, sempre, a imparcialidade e também inserir o Brasil em um
contexto internacional, a BBC Brasil vem aumentando seu número de leitores no
País. Em outubro, nosso conteúdo em português alcançou 11,8 milhões de usuários
únicos.
O conteúdo da
BBC Brasil está disponível no nosso site (www.bbcbrasil.com), nos principais
canais de mídia social, como Facebook, Twitter e Google + e também pelo celular
com um novo site que se adapta automaticamente a qualquer formato de
dispositivo móvel.
A aprovação
neste mês de uma resolução que considera abusiva a publicidade infantil,
emitida pelo Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente
(Conanda), deu início a um verdadeiro cabo de guerra envolvendo ONGs de defesa
dos direitos das crianças e setores interessados na continuidade das
propagandas dirigidas a esse público.
A resolução do
órgão, ligado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República,
abrange anúncios com linguagem, trilhas sonoras e distribuição de brindes de
apelo ao público infantil em anúncios em mídias como TV, sites, rádio, revista
e jornal, assim como propagandas em embalagens e merchandising.
Elogiada por
pais, ativistas e entidades preocupadas com o crescimento dos índices de
obesidade infantil, como o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e
Nutricional (Consea), ela estabelece como abusiva toda a propaganda dirigida à
criança que tem "a intenção de persuadi-la para o consumo de qualquer
produto ou serviço" e que utilize aspectos como desenhos animados, bonecos,
linguagem infantil, trilhas sonoras com temas infantis, oferta de prêmios,
brindes ou artigos colecionáveis que tenham apelo às crianças.
Ficam de fora,
segundo a resolução, campanhas de utilidade pública referentes "a
informações sobre boa alimentação, segurança, educação, saúde, entre outros
itens relativos ao melhor desenvolvimento da criança no meio social".
Ainda há
dúvidas, porém, sobre como será a aplicação prática da resolução. E associações
de anunciantes, emissoras, revistas e de empresas de licenciamento e
fabricantes de produtos infantis criticam a medida e dizem não reconhecer a
legitimidade constitucional do Conanda para legislar sobre publicidade e para
impor a resolução tanto às famílias quanto ao mercado publicitário.
O debate sobre
a validade da resolução também envolve a questão de como serão aplicadas
punições, o que torna a questão ainda mais complicada e intensifica a disputa
jurídica sobre ela.
Em nota
conjunta, as associações de anunciantes, radiodifusores, emissoras de rádio e
televisão e Associação Nacional de Jornais disseram reconhecer "o Poder
Legislativo, exercido pelo Congresso, como o único foro com legitimidade
constitucional para legislar sobre publicidade comercial".
O grupo
defende ainda que a autorregulamentação policiada pelo chamado Conar (Conselho
Nacional de Autorregulamentação Publicitária) já seria uma forma de controlar e
evitar abusos.
O próprio
Conar diz que o código da entidade "proíbe o apelo imperativo de consumo
infantil e propõe que os anúncios devam refletir cuidados especiais em relação
à segurança".
O Conar é
contra a resolução do Conanda, e diz que "a mão pesada do Estado é uma
afronta à liberdade de expressão e vilipendia o direito de cada família
brasileira criar seus filhos da maneira que achar correta".
A Abrinq
(Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos) também emitiu nota
dizendo que a medida "tira da criança o direito do acesso à
informação".
Já a
Associação Brasileira de Licenciamento (Abral), que representa empresas que
realizam o licenciamento de produtos que usam imagens de personagens infantis,
afirmou que o setor precisa "unir forças e atuar conjuntamente para
defender nossos interesses".
Por outro
lado, pais envolvidos no combate ao consumismo infantil comemoraram a medida,
destacando o que acreditam ser a influência negativa da publicidade.
"É
absolutamente positivo e um passo largo em direção à regulamentação", diz
à BBC Brasil Anne Rammi, criadora do portal de conteúdo materno Mamatraca e mãe
de duas crianças, de dois e quatro anos.
Ela se diz
incomodada com a publicidade voltada ao público infantil, mesmo para crianças
que, como seus filhos, não veem TV aberta ou a cabo.
"Mesmo
sem TV, eles estão expostos o tempo todo a produtos licenciados, inclusive em
embalagens de alimentos. Como explicar para uma criança de quatro anos que a
salsicha que tem (um personagem infantil) na embalagem não é um produto legal?
Tudo é voltado ao 'compre', 'consuma', e não é justo que nossa vida seja falar
'não' a isso o dia inteiro."
Rammi
participará neste final de semana de um fórum da Rede Brasileira de Infância e
Consumo, que debaterá a resolução.
"Em
outros países, já começam a articular alternativas, de forma que anúncios sejam
voltados apenas para o público (adulto) que tem discernimento."
A resolução
163, publicada no Diário Oficial da União em 4 de abril, considera
"abusiva a prática de direcionamento de publicidade e comunicação
mercadológica à criança, com a intenção de persuadi-la para o consumo, de
qualquer produto ou serviço e utilizando-se, dentre outros, dos seguintes
aspectos":
- linguagem
infantil, efeitos especiais e excesso de cores
- trilhas
sonoras de músicas infantis ou cantadas por vozes de crianças
- pessoas ou
celebridades com apelo ao público infantil
- desenho
animado ou animação
- promoção com
distribuição de prêmios ou brindes colecionáveis com apelo ao público infantil
O publicitário
Renato Kaufmann, pai de uma menina de 5 anos, acha que a questão cria dilemas
para emissoras dedicadas ao público infantil – muito dependentes de receitas
publicitárias –, mas avalia que o objetivo da resolução do Conanda é
"acertado".
"Como
publicitário, entendo a necessidade de mercado, e me preocupa até que ponto o
Estado brasileiro vai agir como babá. Isso abre precedentes (na interferência
sobre) liberdades individuais", diz.
"Mas como
pai, não acho necessários (os anúncios voltados ao público infantil); a criança
não tem de ser apresentada a opções de consumo dessa forma, feitas com o
objetivo de causar desejo e ansiedade pelas coisas que ela não pode ter."
Para Pedro
Affonso Hartung, advogado da ONG Instituto Alana e conselheiro do Conanda, a
divulgação da resolução "foi um passo histórico no sentido de por fim aos
abusos gerados na hora em que você direciona publicidade para o público
infantil, se utilizando as vulnerabilidades das crianças."
O advogado
defende que anúncios para crianças são injustos pois inflamam um sentimento
consumista e tiram proveito de alguém que ainda está em desenvolvimento,
portanto ainda não tem senso crítico formado para conseguir perceber o caráter
persuasivo da publicidade.
"O Conanda
fiscaliza com os olhos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)",
explica Hartung. "E a resolução agora define mais especificamente o que já
estava previsto no Código de Defesa do Consumidor de uma maneira mais
geral."
Segundo o
advogado, a resolução em si não apresenta as sanções, mas já está implícito que
as punições serão justamente as previstas no Código.
No entanto,
para a advogada Fernanda Kac, do escritório Fialdini Einsfeld, o fato de não
ser explícita pode dificultar a aplicação da resolução: "O problema da
resolução é que ela não traz uma penalidade vinculada."
Para Fernanda,
em vez de uma ferramenta para tentar lhe ajudar determinar uma punição, a
resolução pode ser encarada por um juiz como um novo problema, o de não poder
aplicar uma pena sem indicação expressa, o que pode dificultar outros trâmites.
Para muitos
analistas, a disputa jurídica sobre o tema deve fazer com que o desfecho do
embate ocorra somente após o julgamento dos primeiros casos relacionados à
publicidade direcionada para crianças.
Comentários
Postar um comentário