Último réu do Carandiru é condenado a 624 anos de reclusão
O último réu
acusado de participar do massacre do Carandiru, o ex-policial militar Cirineu
Carlos Letang Silva, de 50 anos, acusado por 52 das 111 mortes do Pavilhão 9, é
o primeiro PM condenado que vai ficar preso pelos crimes de 1992, cometidos
dentro da Casa de Detenção.
O ex-soldado
foi considerado culpado, na noite desta terça-feira, 9, pela maioria dos
jurados, no Fórum de Santana, na zona norte de São Paulo. Segundo a decisão do
juiz Rodrigo Tellini, que presidiu o julgamento, Silva foi sentenciado a 624
anos de reclusão. Os outros 73 PMs que foram condenados em julgamentos
anteriores (dois júris em 2013 e outros dois neste ano) respondem aos crimes em
liberdade e podem recorrer das sentenças que variam de 96 a 624 anos.
Inicialmente,
os ex-policial, que na época do massacre era da Ronda Ostensiva Tobias de
Aguiar (Rota), estava sendo acusado pelo Ministério Público Estadual por 73
mortes registradas no segundo andar do pavilhão. No entanto, o promotor Daniel
Tostas pediu a absolvição do réu em 21 desses assassinatos, detentos que foram
mortos por armas brancas, sem sinais de tiros. A justificativa é a de que esses
presos tenham sido mortos em brigas entre os próprios detentos.
Silva é o primeiro
PM a ficar preso porque já estava detido desde 2011, pela morte de uma travesti
no mesmo ano. O crime foi cometido 72 dias depois que ele ganhou a liberdade
provisória, após cumprir 18 anos de prisão pelo assassinato em série de três
rapazes, também travestis. Ele estava preso desde 1993 e chegou a ser
considerado um serial killer pelo Ministério Público Estadual (MPE) e a Polícia
Civil.
Apesar de
condenado pelo júri no caso da Casa de Detenção, para a Justiça, assim como nas
sentenças para os outros policiais e ex-agentes que aturam no Carandiru, ele
também responde à sentença em liberdade, já que está preso pelo homicídio que
cometeu há três anos.
Durante o
julgamento, Tostas disse que não "cabe ao Ministério Público apontar se
Cirineu matou A ou B" na operação que terminou com os 111 detentos mortos,
mas sim comprovar que o comportamento do policial dentro da Casa de Detenção
"concorreu com o ocorrido" e que ele "participou no
resultado" das 111 mortes.
Na Casa de
Detenção, Silva foi acusado de participar, junto com outros PMs, das execuções
mais violentas do massacre. No andar em que ele agiu, com outros 25 policiais,
alguns presos foram encontrados com dezenas de tiros nas regiões do tronco e
cabeça. "Todos entraram com a intenção de matar e cada um participou de
sua forma", argumentou o promotor aos jurados no momento da réplica.
Na tréplica da
advogada Ieda Ribeiro de Souza, que defendeu todos os policiais condenados, ela
argumentou que o réu foi baleado no braço durante a ação da PM dentro da Casa
de Detenção, sendo socorrido em uma ambulância e impossibilitado de efetuar os
disparos. "Esse homem foi atingido, socorrido dentro de uma viatura. Ele
não tinha condições de efetuar os disparos", disse aos jurados.
A defensora
também afirmou que o perito Osvaldo Negrini, responsável pelo caso, não soube
indicar quais PMs mataram os presos. "O próprio perito entrou em
contradição, dizendo que das 73 mortes ele não saberia indicar quais ocorreram
no segundo andar", afirmou Ieda. Ela também disse que irá recorrer da
decisão. Durante a tréplica ela rebateu o vídeo do filme Carandiru, usado pela
promotoria para sensibilizar os jurados.
"Esse
filme retrata única e exclusivamente o caso. É uma licença poética de um
cineasta que coloca no filme um cavalo subindo escada. Eu lido com a
realidade", disse a advogada. Ela respondeu o filme da promotoria
mostrando um vídeo em que um detento que se diz ser do Primeiro Comando da
Capital (PCC) ameaça e debocha de um juiz.
Por causa dos
ataques contra as travestis, foi pedido um exame de sanidade mental e Silva
precisou ser julgado separadamente dos demais ex-companheiros. Um laudo da
Justiça que saiu pouco antes do julgamento o considera semi-imputável, ou seja,
sabe que está cometendo os crimes, mas não se comporta de acordo com o
entendimento. O promotor usou isso contra o réu. "Dá para imaginar a
participação dele com esse perfil de serial killer dentro do pavilhão",
disse Tostas.
A advogada
pediu para que os jurados não levassem em conta os crimes contra as travestis,
cometidos após 1992. No entanto, em entrevista após o julgamento, ela disse que
os assassinatos podem ter pesado na decisão dos jurados. "Não posso levar
em consideração fatos posteriores a esse (das travestis)", afirmou a
advogada. Ela alegou que quando foi condenado pelo homicídio das três
travestis, o ex-PM estava sendo acusado de 17 assassinatos semelhantes e foi
absolvido na maioria deles.
Fonte: Agência Estado
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